Rir para não morrer https://rirparanaomorrer.blogfolha.uol.com.br Saúde mental com humor Mon, 28 Jan 2019 19:10:39 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 A censura prévia que já está valendo https://rirparanaomorrer.blogfolha.uol.com.br/2018/10/17/a-censura-previa-que-ja-esta-valendo/ https://rirparanaomorrer.blogfolha.uol.com.br/2018/10/17/a-censura-previa-que-ja-esta-valendo/#respond Wed, 17 Oct 2018 15:00:56 +0000 http://rirparanaomorrer.blogfolha.uol.com.br/files/2018/10/black-and-white-black-and-white-depressed-568025-150x150.jpg https://rirparanaomorrer.blogfolha.uol.com.br/?p=200 Não sei como chegamos até aqui nem pela mão de quem descemos a este círculo do inferno, mas a verdade é que o brasileiro já vive um regime de censura prévia.

Tenho tentado, com um entusiasmo meia-bomba, mas vá lá, conversar com pessoas que professam ódio à esquerda, campo ideológico com o qual me identifico. Amigos, parentes, colegas. Confesso que algumas vezes minha paciência se esgotou mais rápido que as baterias desses smartphones mais novos. Mas não houve uma vez em que o resultado tenha sido um aperto de mão. No melhor desfecho, ouvi algo como “mas você, um rapaz tão honesto, metido nessas coisas…”. Na pior, fui xingado por um tio no grupo de família do Whatsapp, um trauma ainda longe de superado.

Tudo bem. O ansiolítico para esses conflitos, seja para mim ou para quem se abalou do outro lado, é voltar para a bolha das redes sociais. Aquele lugar quentinho em que você conta como está cercado de pessoas toscas e recebe uma injeção de dopamina na forma de likes e comentários afinados com o seu pensamento. O problema é que ali também não há debate, não há diálogo de ideias opostas, não há dissonância. Não vai resolver nada.

Desistimos de conversar com o outro. Na minha opinião, quem desiste de falar porque o ambiente não é amigável é vítima de uma censura prévia. Autoimposta, mas censura.

Na semana passada, escrevi sobre como a crise política e econômica tem gerado efeitos perversos na saúde mental das pessoas. Entrevistei seis psicólogos e psiquiatras que contaram como seus consultórios estão cheios de pessoas em crise por causa da eleição. De horas de entrevista, a frase que falou mais alto para mim foi a do professor Benilton Bezerra Jr., do Instituto de Medicina Social da UERJ: “O Brasil tem uma tradição cultural de aversão ao conflito explícito. Tudo é levado para o pessoal. Não somos educados para admitir e cultivar o conflito, o contraditório, a discussão. Nenhum amigo, em público, discorda de um amigo.”

Eu não aprendi a debater, fui criado na sombra da máxima “política, futebol e religião não se discute”. Talvez por isso sejamos essa massa sem ideologia, que sempre vota em convulsões para um lado e para outro, ora se vingando de A ao eleger B, para logo depois trair o canalha do B com o A.

Na minha experiência, política sempre foi assunto proscrito, reduzido a narrativas frouxas, um rendado de fragmentos de fatos e nenhum contexto. Se você ainda não desistiu de mim, deve estar se perguntando o que isso tem a ver com saúde mental. Acredito que tudo. Dezenas de pessoas me escreveram após a coluna anterior expondo crises de ansiedade, agravamento de depressões durante este processo eleitoral. Muitos dos relatos expressavam a falta de condições para conversar com aqueles que professavam voto no candidato oposto como um enorme incômodo, uma sensação de falta de voz, de isolamento social.

Fomos feitos para conversar. Desde o primeiro balbucio que alertava o companheiro para a cobra que preparava o bote na caverna até o “como foi o seu dia?” na hora do jantar, precisamos de comunicação de qualidade para ter saúde mental. Sem comunicação não há laços afetivos, sem se relacionar intelectualmente num ambiente estável e de respeito à lógica somos alguma forma de vida inferior até aos organismos monocelulares que avisam ao outro quando estão a fim de procriar.

Acompanho a escalada da loucura de muito perto desde o final do ciclo eleitoral de 2014. Como um dos autores do Sensacionalista, vi a cobra nascer e engordar. Se não gostavam de uma piada que defendia os direitos humanos, faziam lá um arrazoado pedindo o fim do site porque, pasmem, policiais também morrem. Acho que fomos uns dos primeiros humoristas de destaque a serem chamados de comprados pelo PT diariamente; sendo que, com a mesma periodicidade, batemos em Dilma, em Lula, e em o que de ruim o partido fez.

Quem dá a cara para bater se acostuma, cria calo, bloqueia, segue falando o que acredita. Mas a conversa pessoal, cara a cara, seguiu o mesmo caminho. Eu não acreditava que fosse possível. Em algum momento, a vida real se tornou a infame caixa de comentários do G1.

Não vou falar mais de fake news, porque você deve querer menos ler sobre isso do que eu quero digitar novamente essa maldita expressão. Quem gosta de boataria e mentira tem que se ver com a Justiça. Meu ponto é que, coincidência ou não, o fenômeno cresceu com o enfraquecimento do diálogo pacífico. Nesse espaço cresceu a intolerância de figuras que não deveriam ser eleitas nem para administrar uma prateleira de armário. Quem quer isso? O que fazer agora?

Conversei com o professor de o professor de Psicanálise da USP Christian Dunker, que faz um trabalho formidável para popularizá-la e esclarecer dúvidas sobre saúde mental em um canal de YouTube (ele já tem 97 mil inscritos). Dunker sugere a quem deseja reabrir o diálogo com pessoas extremadas uma abordagem que ele chama de “clínica”. Quem está escutando deve primeiro entender que a outra pessoa não está falando com você, mas com um interlocutor imaginário que só existe na mente dela. Você precisa deixar claro que não é aquela projeção feita por ela, e trazer a conversa gentilmente para o campo da argumentação. “Mas não achem que isso vai dar certo logo pela primeira vez. É uma habilidade que exige prática. Porém, a cada vez que você falha, você aprende algo”.

É isso aí. Quem quiser ter democracia, relacionamentos interpessoais, essas coisas fúteis, vai precisar estudar Psicologia. Que seja. Ainda dá para prestar vestibular este ano.

***

Meu e-mail é marcelinho@gmail.com. Suas sugestões e relatos ajudam bastante

]]>
0
Por que esta eleição está acabando com nossa saúde mental, segundo psicólogos e psiquiatras https://rirparanaomorrer.blogfolha.uol.com.br/2018/10/04/por-que-esta-eleicao-esta-acabando-com-nossa-saude-mental-segundo-psicologos-e-psiquiatras/ https://rirparanaomorrer.blogfolha.uol.com.br/2018/10/04/por-que-esta-eleicao-esta-acabando-com-nossa-saude-mental-segundo-psicologos-e-psiquiatras/#respond Thu, 04 Oct 2018 17:09:37 +0000 http://rirparanaomorrer.blogfolha.uol.com.br/files/2018/10/Screen-Shot-2018-10-04-at-11.19.39-150x150.jpg https://rirparanaomorrer.blogfolha.uol.com.br/?p=187 Quando reparei que não respirava há quase um minuto, percebi que a coisa estava ficando feia para mim. Isso foi há uns dez dias. Estava na cama, já passava das duas da manhã e rolava a timeline do Twitter no automático, na expectativa de a) me deparar com alguma notícia bombástica sobre a eleição, b) ler algum um comentário brilhante sobre o buraco em que nos metemos ou c) ver gifs de cachorros simpáticos. O que encontrei, no entanto, foram especulações insignificantes sobre a campanha, manifestações de pavor disfarçadas de ironia e dezenas de vídeos fofos de gatos.

Acompanhar esta eleição feita de notícias, declarações e manchetes traumatizantes estava acabando comigo. Decidi, então, entrar numa dieta rigorosa de informações. Há uma semana, atravesso a rua para não passar na frente de uma banca de revista, tapo os ouvidos e canto “lalalá” se uma TV estiver ligada no Jornal Nacional e saí de todos os grupos de Whatsapp e redes sociais relacionados ao noticiário. Só soube do problema na bexiga do Ciro Gomes (ele sentiu um desconforto na região e passou por um procedimento médico), por exemplo, na fila da padaria, que acredito ser a forma como Deus quis que soubéssemos desse tipo de coisa.

Nos últimos tempos, tenho prestado mais atenção em onde nasce a ansiedade no meu corpo. Começa nos dedos dos pés e logo chega aos ombros, que acabam empenados; a língua fica dura e empurra a arcada inferior como se quisesse dobrá-la; uma espécie de dormência nas narinas indica que não estou mais respirando.

Conversando com amigos, descobri que não sou a única pessoa que deu defeito na reta final desta eleição. Durante meu detox de jornal brasileiro, resolvi investigar se algo parecido havia acontecido na eleição dos Estados Unidos de 2016. Uma busca rápida mostrou que a saúde mental da população local saiu muito prejudicada daquele pleito. A Associação Psicólogica Americana divulgou uma pesquisa mostrando que, um mês antes da eleição de Donald Trump, 57% das pessoas estavam estressadas por causa da campanha e 66% citaram o futuro da nação como motivo para o incômodo. Os números de 2017, primeiro ano da guerra civil trumpiana, ainda não saíram.

A imprensa de lá perguntou aos profissionais de saúde mental o que eles estavam ouvindo nos consultórios. “As pessoas citam preocupações com o aquecimento global para começar a terapia”, disse a psicóloga Mary Fisher ao blog LifeHack. Segundo ela, inicialmente as pessoas se queixavam apenas de ansiedade. Mas, com o tempo, os sintomas se transformaram numa mistura de “fatalismo e depressão”. O colunista do Washington Post Dana Milbank disse que desenvolveu pressão alta por conta do ciclo eleitoral e foi inundado por mensagens de leitores que contavam estar na mesma situação. A lista de sintomas: distúrbios do sono, dor no pescoço, depressão, zunido no ouvido, perda de cabelo, aperto no peito, úlcera estomacal, indigestão, irritabilidade, refluxo.

Fiquei satisfeito com o que encontrei no exemplo americano para explicar minha ansiedade eleitoral. Mas, como não sou especialista em absolutamente nada neste mundo, resolvi perguntar a alguns dos maiores estudiosos brasileiros em ansiedade e estresse se eleitores em crise haviam batido em suas portas. Aproveitei para saber o que fazer para aliviar o sofrimento nesta reta final. Também conversei com alguns brasileiros que, como eu, não conseguem mais encarar o que quer que esteja acontecendo com o país neste momento.

A psiquiatra e psicóloga gaúcha Ana Maria Rossi é presidente da International Stress Management Association do Brasil, referência no estudo de estresse e ansiedade. “Essa profusão de pesquisas está afetando muito as pessoas. Meus próprios clientes não estão mais tolerando saber o que está acontecendo”, afirma. Além do excesso de informações, Ana Maria cita a rivalidade exagerada como motivo de preocupação. “Vejo um ódio, uma agressividade muito grandes. Sempre teve baixaria em campanha no Brasil, mas me parece que dessa vez a animosidade é maior. Somos nós contra eles, ou eles contra nós.”

A psicóloga Mariângela Savóia, pesquisadora do Ambulatório de Ansiedade do Hospital das Clínicas, diz que nunca viu seus pacientes tão preocupados com o quadro político como agora. “O que eu vejo mais é a ansiedade, uma grande preocupação antecipada, uma avaliação negativa do que vai acontecer”, afirma a psicóloga. “Quem tem dinheiro diz que vai sair do país, e isso independe da orientação ideológica.”

“Como individuo, você fica sem possibilidade de prospectar o seu futuro, algo que é necessário para a boa saúde mental”, diz Rafaela Teixeira Zorzanelli (sem parentesco direto comigo), psicóloga e professora do Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Ela atualmente faz pesquisa sobre o abuso de tranquilizantes no Brasil em uma universidade holandesa, mas também está viciada em acompanhar o pleito de 2018. “Colegas têm dito que seus pacientes sentem que não têm qualquer controle sobre o futuro. Em todas as classes sociais, de consultórios do SUS até clínicas particulares que cobram caro.”

O psiquiatra Felipe Dias trabalha na rede pública do Rio de Janeiro. Segundo ele, a gravidade das queixas dos menos favorecidos o surpreendeu. “Essa grande polarização coloca os mais pobres num lugar muito mais de fim de mundo, de desespero completo. Isso tem causado o aumento no uso de tranquilizantes e piora certos quadros deprimidos”, afirma Felipe, que atende comunidades carentes em Niterói e na capital. “É uma sensação de iminência da falta dos serviços básicos dependendo de qual candidato ganhar. Vejo um voto desesperado ligado ao medo.”

Mecânico na pequena Miracatu, no interior de São Paulo, Milton Junior de Souza, de 29 anos, está desempregado há dois anos. Quem sustenta a casa é a mulher, cabeleireira, e um eventual bico que ele próprio consegue. Milton vai votar em Jair Bolsonaro. “Tudo o que está acontecendo nesta campanha política está nos deixando mais ansiosos e estressados”, diz o mecânico, que quer tentar a vida no Japão caso seu candidato perca. “Ficamos estressados pelo que a mídia faz contra o nosso candidato e porque não há clareza na campanha. “

O psiquiatra e professor de medicina social da UERJ Benilton Bezerra Jr. afirma não ter visto um abalo tão grande na saúde mental de seus pacientes em muito tempo. “Converso muito com as pessoas na rua e vejo o tamanho da confusão delas. Eu vejo gente que está dividida entre Jair Bolsonaro e Marina Silva, entre Bolsonaro e Ciro Gomes. Alguém que está com esta dúvida é porque realmente não está entendendo nada do jogo que está sendo jogado. E isso é muita gente”, disse.

“Quando estou olhando as redes sociais sinto crescer a ansiedade e uma angústia enormes”, diz um empresário de Vitória (ES), que prefere não se identificar. Simpatizante da direita, ele ainda não sabe quem escolher. “Eu já sou ansioso e essa eleição só piorou a situação. Mas acho que o pessoal progressista está sofrendo da mesma forma.” O empresário declara que não votaria no PT, nem em Bolsonaro. “Fica então aquela pressão. Mas eu não quero votar de jeito nenhum nele (Bolsonaro). Ah, mas tem que votar porque se não o PT volta. Aí eu penso ‘poxa, mas eu vou ser o responsável pela volta do PT?’ Isso te afeta.”

Segundo Ana Maria Rossi, está aí a característica desta eleição que mais tem feito mal às pessoas. “Vejo entre meus clientes muitos comentando que têm de votar em alguém com chance de derrotar ‘o outro lado’, em vez de votar naquela pessoa em que ela gostaria.” A psiquiatra continua: “Observo um aumento de pessoas com problemas de sono. Também cresceram as reclamações de dores musculares. As pessoas com os músculos mais tensos têm mais dores de cabeça, dor no pescoço, nos ombros, nas costas, pernas inquietas.”

A professora de sociologia Juliana Dourado trabalha numa universidade pública na Bahia e têm tido insônia, pesadelos e dificuldade de concentração. Ela diz que vota na esquerda e demonstra muita preocupação com uma possível vitória de Bolsonaro. “A gente estuda, passa anos debatendo, lendo, escrevendo, chega lá e abre a rede social e vê um monte de notícia falsa, montagens muito mal feitas… parece que tudo o que eu fiz foi em vão”, diz. “Eu tenho muito medo, trabalho numa faculdade nova, criada pelo governo de esquerda. Tenho receio de que o campus possa ser fechado no ano que vem. Isso gera uma instabilidade emocional muito grande, não consigo planejar nada para os próximos meses” afirma. Os sintomas que estão aparecendo são de isolamento, abulia, que é a falta de vontade de fazer as coisas, diz a psicóloga Rafaela. “Em vez de se confrontar, o indivíduo se retira, porque está batendo no limiar de sua tolerância para o sofrimento.”

Um outro traço muito moderno desta eleição são as discussões com pessoas queridas que têm posições contrárias.

“Debater com alguém, especialmente alguém com quem se tem laços afetivos, para tentar mudar um voto, tem um custo emocional muito grande”, diz Rafaela. “Muitas pessoas estão fazendo isso porque acreditam que a vida delas depende disso, então vão para a briga porque acreditam estar lutando pela sobrevivência. Algumas suportam melhor o embate com o outro, outras saem mais machucadas.”

O professor Benilton dá uma pequena aula sobre nossa incapacidade de exercer o debate civilizado: “Um traço muito brasileiro, que é diferente de outros países, o Brasil tem uma tradição cultural de aversão ao conflito explícito. Tudo é levado para o pessoal. Não somos educados para admitir e cultivar o conflito, o contraditório, a discussão. Nenhum amigo, em público, discorda de um amigo. Isso mesmo no mundo acadêmico, o que é lamentável.”

O resultado mais preocupante de tanta carga emocional negativa pode ser o agravamento de diagnósticos já complicados. “O nível de ansiedade tem feito com que alguns pacientes aumentem a dosagem dos remédios”, diz Ana Maria. “As pessoas também podem se valer mais do álcool para se anestesiar e mudar o foco, como uma forma de não vivenciar isso com muita intensidade.

O que fazer, então, para tentar salvar o pouquinho que nos resta de sanidade? A especialista em estresse Ana Maria e seus colegas têm uma listinha de sugestões:

“Limitar a exposição à mídia. O que eu preciso saber, o que é o bastante para que eu me sinta capacitado para votar? Ter disciplina, porque a curiosidade acaba sendo uma isca para manter a pessoa extrapolando seu limite por períodos muito longos.”

“Limitar essa necessidade que muitas pessoas têm de divulgar notícias bombásticas, esse instinto de espalhar tudo para os outros acharem que sou super bem informado.”

“Não conversar com pessoas que você sabe que são radicais. Se você sabe que o seu amigo, parente, colega de trabalho é radical, invente uma desculpa. Diga que está atrasado, que não pode falar agora, e fuja.”

“Vote por convicção, não para derrotar um outro candidato. Seja dono da sua própria ideologia. Concentre a energia e a atenção em eleger o candidato que acha que melhor vai resolver a situação do país.”

Uma vez mais calmo e tranquilo por saber que não é só você que está ficando maluco, fique com a mensagem democrata do professor Benilton:

“A solução é conversar, debater, estudar. Esta confusão não se dá em torno de programas, de projetos. É uma conflagração em torno de afetos e sentimentos. A pessoa precisa tentar sair do seu grupo, conversar com pessoas de fora da sua bolha com quem haja diálogo e tentar debater ideias, argumentos e dados sem medo de todas as contradições e dubiedades da qual a realidade está cheia. É preciso resistir à tentativa de simplificar tudo, abraçar a complexidade da situação.”

E usar a internet só para procurar gifs de cachorros fazendo coisas engraçadas até 2022.

***

E você? Como tem se sentido nesta eleição? Estou aqui para ouvir a sua história. Meu email é marcelinho@gmail.com

]]>
0
A vergonha e a culpa na mente dos deprimidos https://rirparanaomorrer.blogfolha.uol.com.br/2018/06/05/a-vergonha-e-a-culpa-na-mente-dos-deprimidos/ https://rirparanaomorrer.blogfolha.uol.com.br/2018/06/05/a-vergonha-e-a-culpa-na-mente-dos-deprimidos/#respond Tue, 05 Jun 2018 20:00:37 +0000 http://rirparanaomorrer.blogfolha.uol.com.br/files/2018/06/vangogh-150x150.jpg http://rirparanaomorrer.blogfolha.uol.com.br/?p=38 Sentir vergonha da própria doença nunca tirou ninguém da depressão. Quer dizer, até tirou, mas aí tirou da vida também.

(Estou falando com não só com você, que vive com a depressão clínica, mas também quem tem ansiedade ou outros transtornos de humor).

Com a frequência, seu inconsciente manda você sentir culpa, vergonha e ressentimento por ser como é. Estou errado?

Porque o inconsciente está sempre aí, vendo e ouvindo tudo.

E as coisas que o insconciente vê e ouve dizem que ter um transtorno mental é uma vergonha. Que você deve se sentir culpado porque cada pessoa do planeta, até quem já morreu e foi cremado, está agora ao lado de uma lareira com o amor de sua vida, tem milhões no banco, um cachorro fotogênico que recebe mimos no Instagram.

Vergonha é assassinar, roubar, usar pochete. E não nascer com uns neurônios que vieram quebrados de fábrica.

“A vergonha é uma emoção que devora a alma”, escreveu o lendário psicólogo Gustav Jung. Segundo o bom velhinho suíço, com o tempo as mensagens de reprovação se confundem com a realidade da alma. Seu “eu” mais íntimo reconhece a si próprio como um inimigo a ser destruído. A vergonha é um parasita que não liga em matar a si próprio desde que elimine o hospedeiro também.

Jung disse que a vergonha em sua forma mais virulenta diz ao indivíduo que ele é tão “estragado” que não tem o direito de existir.

Esta dinâmica é cruel o bastante numa mente saudável. Num cérebro como o nosso, que parece ser administrado pelo governo Temer, é uma tortura engenhosa.

Porque a primeira defesa diante da vergonha é se esconder. E quem sofre com transtornos mentais, especialmente a depressão clínica, quando se esconde fica pior, e muito. Eu recebi dezenas de emails de leitores que lutaram muito antes de convencerem a si próprios a falar com os próprios pais. Com os próprios pais.

A doença já faz tudo para que você fique parado e isolado. “A depressão não gosta de alvos móveis”, li outro dia. Ela prefere chegar bem perto e atirar a queima roupa, sozinha com você num canto.

Mesmo depois de já estar em tratamento, a vergonha e a culpa resultam numa pressa de voltar logo ao “normal”. Isso atrapalha demais o tratamento.

Deixa eu te dar um spoiler: você não vai voltar ao normal. Porque não tem normal. Eu não hesitaria um segundo em dizer que você é mais saudável mentalmente que a sua tia preconceituosa que chama você de preguiçoso durante uma crise de depressão.

Existe o saudável, que é possível alcançar quando você toma conta de si próprio. Terapia, antidepressivos, exercício físico, alimentação saudável e… Eu colocaria um outro remédio aqui: humildade. Mas não aquela humildade de entrevista de jogador de futebol. Estou falando de aceitação diante da realidade da sua condição.

Repito: não existe normal. Não tem cronograma para melhorar. Nem a ciência sabe como os anti-depressivos funcionam. Algumas pessoas precisam passar por três, quatro medicamentos até atingir alguma melhora. Daqui a 100 anos, haverá placas nas praças homenageando esta geração de cobaias de remédios como herois. É uma loucura você só saber se o remédio serve para você depois de três semanas ou um mês. Imagina tomar um analgésico agora para melhorar um torcicolo que virá daqui a 30 dias.

Sob preconceito e sem ajuda da família e dos amigos, quem vai ter estrutura para passar pela fase de adaptação aos santos antidepressivos? Um deprimido é que não vai. Muita gente abandona o tratamento por causa do estigma.

Por fim, um recado para quem convive com deprimidos:

Tudo bem que você não tenha saco para ouvir seu colega, irmão, filho, falar que não está se sentindo bem da cabeça há um tempo. É mesmo chato! Acredite: nós sabemos como a vida é difícil!

A questão aqui é de saúde, e pode ser grave. Ninguém gosta de ter uma fratura exposta na perna e precisar de meses de fisioterapia. Mas não dá para ignorar quando alguém que você conhece chega com a canela partida ao meio, né? Não dá para pedir ao sujeito para dar uma andada para ver se passa. Você leva num especialista e tenta ajudar.

A depressão mata muito mais do que perna quebrada.

E não tem ninguém com vergonha ou culpa porque foi atropelado por um carro desgovernado e quebrou a perna.

***

Como sempre, meu e-mail está aberto para ouvir histórias. Gostaria de ouvir de você que superou crises profundas e hoje está muito bem na parada. Estou compilando depoimentos anônimos para escrever posts com histórias que tenham similaridade. Meu e-mail é marcelinho@gmail.com

]]>
0
No Brasil, 5º mais deprimido do planeta, ninguém sofre de depressão https://rirparanaomorrer.blogfolha.uol.com.br/2018/05/18/no-brasil-o-5o-mais-deprimido-do-planeta-ninguem-sofre-de-depressao/ https://rirparanaomorrer.blogfolha.uol.com.br/2018/05/18/no-brasil-o-5o-mais-deprimido-do-planeta-ninguem-sofre-de-depressao/#respond Fri, 18 May 2018 11:16:25 +0000 http://rirparanaomorrer.blogfolha.uol.com.br/files/2018/05/images-30-150x150.jpeg http://rirparanaomorrer.blogfolha.uol.com.br/?p=12 Na França, se você é diagnosticado com depressão o governo age imediatamente. Você ganha uma câmera de cinema, quilômetros de película preto e branco e dois atores para ficarem fumando e reclamando da vida por duas horas e meia de filme. No fim, você leva um troféu em Cannes. Tudo de graça.

No Brasil, você não pode nem mais compôr um samba triste. Sai fora, Nelson Cavaquinho, que não tiramos o sorriso do caminho para você passar com a sua dor. E você, Cartola, nem venha com essa de que reduzirão nossas ilusões a pó.

Somos um povo alegre, nossa cabeça é abençoada todos os meses do ano com o sol forte (que comprovadamente mata os pensamentos ruins). Aqui não tem tempo ruim, não, chefia!

Parando para pensar, somos vanguardistas. A sociedade brasileira já era boa em fingir que tudo está bem muito antes do Instagram e do Facebook.

Em algum momento perdemos a capacidade de teatralizar nossa tristeza. Paramos de chorar em público e perdemos nossa catarse tribal. Quando foi que deixamos de ouvir Vicente Celestino? Como explicar que uma das músicas mais ouvidas em 1951 era “Coração Materno”, sobre um rapaz que rasga (aparentemente com as mãos) o peito da própria mãe, e dele arranca seu coração para dar de presente à namorada?

O povo se lambuzava nessa tristeza farsesca e isso era bom. Pelo menos era mais honesto.

Falta se olhar no espelho. Somos um país onde viver é difícil demais. Ler o noticiário de um único dia no Brasil deve equivaler a sessenta anos no front de alguma guerra no Oriente Médio. Não posso comprovar este dado.

Já os que citarei em seguida, posso, sim: são da Organização Mundial de Saúde. A média global de pessoas com depressão é de 4,4%. Aqui, temos 5,8% da população sofrendo da doença, a maior potência em depressão na América Latina. No ranking da OMS, o Brasil é o quinto mais deprimido do mundo. A Síria está em 58º. Estamos à frente de todos países em guerra, menos a Ucrânia. Ziriguidum!

Temos também a maior prevalência de ansiedade no planeta: 9,3%. Rivotril é o segundo remédio mais vendido do país. Aqui, os antidepressivos só saem menos que os analgésicos. Tudo indica que ser brasileiro é sinônimo dor, no corpo e na alma.

Espero tentar, com leveza, usar este espaço para atacar o preconceito e enriquecer o diálogo. Vamos falar do estigma profissional (tem gente que falta e diz que pegou uma disenteria para não dizer que está tendo crise), do movimento antimanicomial, de como a saúde pública quase ignora o pobre doente (que, segundo um estudo inglês, têm o dobro de chance de desenvolver quadros depressivos), de remédios que brocham e de ficar o dia inteiro na cama vendo porcaria no YouTube.

Imagine a marcha dos deprimidos: ninguém iria pelo medo do que o outro vai achar. Esta é a intenção deste espaço: falar e, antes de mais nada, dar voz.

Espero receber e-mails contando histórias, como está sendo o tratamento, o que você faz para se sentir melhor, quais caminhos foram mais importantes para você na hora de sair do buraco. Quero histórias, não importa de que tipo, que possam inspirar.

Meu e-mail é marcelinho@gmail.com. (Sim, é só “marcelinho” mesmo. Eu fiz o e-mail em 2004).

]]>
0