Prem Baba e a perversidade do predador em pele de curandeiro

As pessoas que buscam o guru espiritual Prem Baba, de 52 anos, querem melhorar suas vidas. Alguns têm problemas psicológicos como depressão e ansiedade, outros sentem que perderam o propósito. Pessoas muito vulneráveis vão a seus retiros atrás de paz e significado.

Prem Baba foi acusado de abusar sexualmente de duas de suas seguidoras. Ele não nega o envolvimento. Os detalhes da denúncia feita pelo ex-marido de uma delas (leia no link para a coluna de Mônica Bergamo) são de fazer Krishna querer quebrar sua flauta sagrada de raiva.

O guru pop, que é recomendado com fervor por celebridades como Bruna Lombardi e Reynaldo Gianecchini, não seria o primeiro líder espiritual a cometer o que é, a meu ver, um dos crimes mais cruéis que se pode praticar: o abuso cometido por figuras de autoridade dentro de cultos e religiões.

A igreja católica refinou esta prática e a transformou em uma de suas principais marcas. No Brasil, pastores neopetencostais são denunciados e presos com frequência. Nesta semana, o pastor Justino Ireno da Costa, de Cuiabá, foi preso por abusar de 10 crianças em um bairro carente da cidade. Outro, de São Luis, foi preso pelo estupro de uma menina de 11 anos enquanto tentava fugir pelo aeroporto Santos Dumont.

Qualquer beatlemaníaco de baixa patente sabe da história por trás da faixa “Sexy Sadie”, do Álbum Branco. Em um retiro na Índia em 1968, o guru Maharishi Mahesh Yogi recebeu os Beatles e outras celebridades. Maharishi teria assediado a atriz Mia Farrow. “Sexy Sadie, você quebrou as regras” e “O que você fez? Você fez o mundo inteiro de bobo” são versos da canção.

Figuras revestidas de autoridade religiosa têm o poder de despir seus seguidores da desconfiança e de barreiras racionais. Faz parte do processo que pode trazer paz e tranquilidade a uma alma turbulenta. Ou pode ser a arma mais perigosa do mundo.

A crença nos ensinamentos se confunde com a confiança na pessoa por trás da bata ou da batina.

Por isso, acho que a lei que versa sobre abuso sexual e estupro deveria ter um agravante para líderes religiosos (acho também que profissionais de saúde mental que cometerem este crime deveriam ter o mesmo tipo de punição mais grave).

Abusar sexualmente de alguém que está sofrendo por conta de traumas e se abre diante de um cuidador é, na minha opinião, uma espécie de estupro de vulnerável.

Em que outra situação um adulto, como no caso das mulheres que acusam Prem Baba, seria convencido que fazer sexo com um estranho teria efeitos mágicos sobre sua saúde? Esse tipo de argumentação fantasiosa só funciona diante da inocência das crianças ou de alguém fora do controle de suas faculdades mentais.

O psicólogo Janderson Fernandes, nome de batismo de Prem Baba, um dia foi um homem preso a um casamento em crise que chegou a participar de rituais com o chá alucinógeno do Santo Daime antes de se tornar um mestre iogue na Índia. Sob orientação de uma sumidade do hinduísmo, assumiu o nome de Prem (amor divino) Baba (Santidade).

Que tipo de perversidade pode fazer com que alguém que já se beneficiou dos ensinamentos do hinduísmo, uma das religiões mais belas e pacíficas do mundo, a usar o que aprendeu para ferir inocentes?

Pessoalmente, sempre achei que comunidades que cultuam a personalidade de seu líder têm a mesma chance de dar certo que o Temer tem de criar trabalho para os 27,7 milhões de brasileiros desempregados até o fim do mandato.

Essa história de guru pop com um pé no falido movimento New Age não me parece um caminho venerável, por assim dizer. O despertar espiritual é lento e um processo voltado para dentro. Essa espécie de “despachante da alma”, com delivery de paz e esperança, que facilita o processo de acordo com o preço na tabelinha não entra na minha cabeça.

Após o estouro da bomba e do anúncio de seu “recolhimento” por tempo indeterminado, o guru postou no Twitter a seguinte mensagem:

“A crise representa uma necessidade de mudança, um desapego. Significa que algo precisa ir embora. E quanto maior o apego àquilo que precisa ir embora, maior a resitência ao processo de transformação e, consequentemente, maior o sofrimento”.

Pode ir embora, Janderson, que o sofrimento você já deixou por aqui.

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