Quem é ansioso de verdade está morrendo de rir com o pânico coletivo dos boatos de WhatsApp

(Miguel Schincariol/AP)
Marcelo Zorzanelli

Quem tem que lidar com crises de ansiedade frequentes está olhando para o catastrofismo no grupo de WhatsApp da família por causa da crise de abastecimento e dando boas risadas.

É óbvio que a crise trouxe dor de cabeça e sofrimento para um país que depende da malha viária até para comer. Mas estou falando do riso que escapa diante dos exageros dos amantes de boataria de terceira. Acho que são pessoas com a nostalgia de um sentimento, o pânico, que não costumam experimentar.

Abro o grupo de família, vejo aquela cascata de tensão inútil e sinto o que deve sentir o atleta profissional ao assistir uma partida entre times da quinta série. É fofo, dá vontade de sair apertando as bochechas.

Mas queria era dizer: “Olha, o 4º Esquadrão de Cavalaria Mecanizada chegando para tomar o poder na cidade com quatro blindados e três caminhões é sopa. Tragédia é esquecer o ansiolítico em viagem longa”.

O Transtorno de Ansiedade Generalizada, quando atua em grande forma, é pior do que receber qualquer má notícia. Porque é uma única notícia tocada em looping: “Camarada, você vai morrer. Agora. Faz alguma coisa.”

Ninguém até hoje sabe o que é essa tal coisa.

Sendo mais didático, um ataque de pânico é o seguinte: você está sentado no seu trabalho em 2018, teto sobre a cabeça e carpete fofo debaixo dos pés, e um pensamento idiota de 1997 faz seu corpo ter a mesma resposta que seus antepassados na savana africana há 100 mil anos ao ouvir o rugido próximo de um leão faminto.

Quando você está bem treinado assim, dá até para agir com certa empáfia quando um tio encaminha um áudio dizendo que “no Paraná já estão abrindo as bicas dos caminhões de combustível e colocando fogo na estrada”. Ah, tenha paciência.

Quem sofre com a coisa legítima tem anticorpos contra boataria mal feita. Não foram poucas as vezes que, em situações pessoais ou profissionais de muita confusão, fiz exatamente o contrário do que eu esperava de mim mesmo: fui o mais controlado.

Este é um paradoxo do ansioso que não consigo entender muito bem. Lembra até aquele arquétipo literário do soldado que enlouquece de ansiedade na calmaria dos tempos de paz e por isso sai caçando guerras pelo mundo (Ernest, estou falando de você).

Por fim, boatos de redes sociais e crises de pânico/ansiedade têm uma característica em comum: nenhuma relação com a realidade.

Se você não recebeu os deliciosos boatos de WhatsApp neste fim de semana, não se preocupe. Fiz uma aqui uma seleção, respeitando, claro, a grafia original.

“O governo vai cortar a energia do cidadao se os caminhoneiros não voltare a trabalhar. O WhatsApp já está bloqueado faz 48 horas” (Detalhe: a mensagem foi recebida por WhatsApp)

“O Temer foi na Câmara e bateu no Rodrigo Maia para decretar estado de sítio!! A TV não tá passando! O exército foi convocado! Isso a Globo não mostra!”

“O general deu a última chance ao vivo pro governo ate segunda feira. As Força Armadas estão prepatada para tomar o Brasil!”

“Estava vendo um general do exército agora falando numa rádio lá do Paraná que o Temer não caiu o exército só nao pode dar o golpe porque a ONU não deixa mas se as pessoas ocupar as ruas a ONU não pode se opor contra! Ir todos para as rodovias com seus carros!”

“O TEMER COMUNISTA e seus comparsas é que estão causando danos ao POVO BRASILEIRO! Nao traiam o povo”

E, claro, o clássico instantâneo:

“Não vamos deixar as forças militares obrigar os caminhoneiros a desocupar as estradas! Intervenção militar já!”